O impacto da Lei 13.431 no Sistema de Garantia de Direitos é tema do primeiro debate na UERJ

Categoria(s):  DIREITOS HUMANOS, JUSTIÇA, Notícias   Postado em: 21/09/2018 às 11:56

A primeira mesa redonda do evento realizado pelo CRP-RJ em parceria com o CRESS-RJ foi “O impacto da Lei 13.431 de 2017 no Sistema de Garantia de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes”, que ocupou a UERJ, no dia 18 de setembro. Os palestrantes convidados para o debate foram Maurilio Mattos, da Secretaria de Saúde de Duque de Caxias; Sergio Henrique Teixeira, psicólogo, mestrando em Psicologia Clínica (PUC-Rio) e assessor técnico da ACTERJ; e Esther Arantes (CRP 05/3192), psicóloga, professora PPFH/UERJ e da PUC-Rio, como mediadora.

Esther Arantes foi a primeira a trazer sua contribuição contextualizando o início das discussões do chamado “depoimento sem dano”. “Alguns anos atrás numa reunião da Comissão de Direitos Humanos, uma senadora, veio propor um projeto de lei que já falava sobre o depoimento sem dano. O ECA (Estatuto da Criança e Do Adolescente) ia fazer 18 anos de sua criação, e ela falou que queria aprovar essa lei como um ‘presente’ para o aniversário do ECA. Ponderamos se esse seria o melhor presente para as crianças. Até porque não houve audiência pública não houve nenhum tipo de consulta às entidades ou à sociedade civil”. esther

O projeto então foi retirado da pauta porque a senadora àquela época acatou o pedido de audiência pública e o CFP (Conselho Federal de Psicologia) foi convidado para a audiência na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. As observações do CFP foram consideradas pertinentes, pois os problemas apontados no projeto deveriam ser melhor discutidos. Apesar da lei não ter passado nesse primeiro momento, as salas de depoimento sem dano viraram uma realidade pelo país, segundo a psicóloga.

“Passado algum tempo o projeto da lei foi resgatado, passou por algumas poucas modificações, e tramitou em regime de urgência, sendo aprovado ‘a pedido’ de Marcela Temer, porque o presidente Temer queria apresentar num evento que teve a presença do rei e da rainha da Suécia”, contou Esther.

A partir dessa aprovação, o judiciário tentou criar protocolos que obrigam as (os) psicólogas (os) e assistentes sociais a realizarem o depoimento especial, muito embora a Lei em si não obrigue. A grande questão, segundo Esther, é que a produção de provas é o objetivo deste tipo de depoimento especial, e a escuta especializada dos profissionais da Psicologia e da Assistência Social seria a técnica buscada pelo judiciário para prosseguir o processo punitivo.

O psicólogo Sérgio Teixeira começou sua fala explicando, “essa lei 13.431 de 2017 se propõe a estabelecer o sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência e altera a Lei 8069 de 1990 o Estatuto da Criança e do Adolescente”.  Segundo a Resolução 113 de 2006 do CONANDA, “o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente constitui-se na articulação e na integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade civil, na aplicação de instrumentos normativos e no funcionamento dos mecanismos de promoção defesa e controle para efetivação dos direitos humanos da criança e do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal”. Ou seja, segundo os dados apresentados pelo psicólogo pode-se notar que a lei de 2017 não traz nada de novo além, especificamente, do depoimento especial. Mas, Sérgio adverte para não “apelidarmos” a Lei 13.431 de “lei da escuta especializada”, porque o grande objetivo, segundo o psicólogo, é “temos uma lei que procurar se valer das técnicas da escuta de profissionais da Psicologia e da Assistência Social para punir o possível agressor, a ideia aqui é criar materialidade e produzir provas pouco importando revitimização da criança. Não paramos nunca para pensar em cuidar do agressor, se é que que ele realmente é um agressor, e procurar refletir sobre o que, na nossa sociedade, brutaliza tanto as pessoas a ponto de produzirem violência”. mesa esther 2

Maurílio trouxe sua contribuição para o debate a partir da sua experiência como assistente social analisando o impacto dessa lei na visão de mundo e de democracia defendida pelo Serviço Social. O assistente social mostrou que a lei representa uma consagração do retorno do poder judiciário na vida de crianças e adolescentes, “temos aqui a cristalização legal, um retorno de poder do judiciário sobre a vida e as profissões de outros. Houve um reordenamento do judiciário para pautar o trabalho de outros profissionais, como psicólogos e assistentes sociais. Todo o aparato normativo judiciário a serviço de buscar técnicas profissionais que se adequem a produção de provas.” Maurílio pontuou uma curiosidade, “a lei 13431 é um palíndromo, ou seja, lida de trás para a frente é o mesmo número. Palíndromo vem do grego e já significava ‘mais do mesmo’, ‘de novo’, ‘novamente’, ‘repetição’. Isso me parece bem sugestivo, pois essa lei vem falar o que já tinha sido falado”. “Trata-se aqui de uma disputa de concepções de mundo, de concepções de direitos humanos e políticas públicas. A concepção norteadora desta lei é uma visão punitiva” explicou Maurílio, mostrando que a lei 13.431 de 2017 consagra um concepção conservadora focada na punição e não no trabalho preventivo, através, inclusive, da educação e da saúde. Segundo o assistente social, a sociedade deveria se pautar na prevenção da violência e não apenas na punição.

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