Mesa na IV Mostra debate tensões e possibilidades no encontro da Psicologia com a Educação

Categoria(s):  EDUCAÇÃO, MOSTRA, Notícias   Postado em: 26/07/2010 às 11:42

No terceiro dia da IV Mostra Regional de Práticas em Psicologia, 24 de julho, a Comissão de Educação do CRP-RJ realizou a mesa “Tensões no encontro da Psicologia com a Educação: novos possíveis?”. A atividade foi iniciada com a exibição do vídeo “Educação inclusiva”, que havia sido distribuído aos participantes do evento, e, em seguida, houve palestras com profissionais que atuam na área.

Viviane Pereira da Silva (CRP 05/31297), psicóloga da Secretaria Municipal de Educação (SME) do Rio de Janeiro e premiada na categoria profissional do I Prêmio Margarete de Paiva Simões Ferreira, começou abordando possíveis razões de haver tensão no encontro da Psicologia com a Educação. “Quando pensamos em tensão, pensamos em algo negativo. Mas ela também possibilita algo novo, a partir da diferença. A Educação tem como objetivo o aprendizado universal, enquanto a Psicologia tende a priorizar a singularidade, o que é específico de cada um. Essa diferença traz a possibilidade de diálogo. Se não houvesse diferença, não faria sentido haver psicólogos na Educação”.

Mesa de Educação: Viviane, Mariana, Pedro e Marina

Mesa de Educação: Viviane, Mariana, Pedro e Marina

Ela contou também sobre seu trabalho no Proinape (Programa Interdisciplinar de Apoio às Escolas Municipais), antiga Rede de Proteção ao Educando (RPE). “Há dois vieses no trabalho: relações entre o público interno da escola e articulação com a rede intersetorial”. Segundo a psicóloga, a equipe era sempre chamada a escolas com baixos índices no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). “O que era endereçado ao psicólogo, num primeiro momento, eram queixas gerais e parecidas: violência, falta de atenção, agressividade etc. Ou seja, o que fugia ao controle da escola, causando um mal-estar”.

Assim, a escola chamava os psicólogos com o objetivo de “consertar” a situação. “Tinham a expectativa de que, de uma hora para a outra, transformaríamos a relação difícil da criança com a escola e da escola com ela. Como se o tratamento fizesse a criança ‘funcionar’ como a escola quer. Ou seja, chegavam demandas de psicologização e medicalização”.

Viviane destacou que uma possível saída é a interdisciplinaridade. “Buscamos estar sempre em parceria com o educador, no sentido de mostrar a ele que também faz parte da relação com a criança. Outra saída é fazer falar o sujeito. Se num primeiro momento chegam queixas de crianças violentas, agressivas, que não aprendem, podemos desdobrar essa fala e perguntar, por exemplo: ‘de que forma ela é agressiva?’. Com isso, a sensação de impotência pode se transformar em enigmas e podemos apostar em novas coisas”.

Em seguida, Marina Sodré Mendes Barros (CRP 05/32061), também psicóloga da SME do Rio de Janeiro e mestre em saúde coletiva, também trouxe sua experiência no Proinape. “No início, eu achava que a escola não precisava de psicólogo. Acreditava que as queixas e problemas eram devido ao sucateamento da escola. Hoje, compreendo que eu estava tentando precisar as origens do dito fracasso escolar, eu me encontrava repetindo as mesmas queixas. Passei a tentar ver a implicação subjetiva de cada um na escola”.

Além desses impasses, a palestrante apresentou ainda a experiência de um trabalho que teve resultados positivos. “Era uma escola com baixíssimo desempenho e a direção dizia que o fracasso se devia a problemas dos alunos. Ou seja, a escola estava mergulhada em uma lógica de individualização. Propusemos um estudo de caso: em uma turma de 8º ano, fizemos um jogo de perguntas e respostas. Foi a primeira vez que ouvimos Ingrid, uma menina de 8 anos vista como altista. Mas, nessa atividade, ela falou e participou”.

Assim, Marina percebeu que a menina queria ser escutada, o que passou a ser feito pela escola. “Isso levou a uma mudança de relacionamento. Na festa junina, por exemplo, ela foi chamada a dançar e conseguiu seguir os passos. Ela dançou no ritmo dela, mais lento, mas conseguiu repetir a coreografia”.

“Esses efeitos vieram da nossa negativa de dar respostas prontas. Quando chegamos, a lógica da escola era a da produção de culpados, mas houve uma mudança de posição, saindo da culpabilização para a implicação no fracasso escolar. Isso coincidiu com o deslocamento do psicólogo do lugar de especialista”, concluiu.

Finalizando a mesa, o psicólogo Pedro Martins de Oliveira (CRP 05/32232), também da SME do Rio de Janeiro, abordou o trabalho do Proinape em uma escola de um bairro considerado violento. “No livro Guardiões da Ordem, Cecília Coimbra fala da disciplinarização, nas décadas de 1960 e 1970, de qualquer elemento que escapasse ao que era considerado ‘normal’ – eram os subversivos. A demanda era haver uma ‘cura’ para o ‘inimigo em potencial da sociedade’. Hoje, vejo isso na escola. Fala-se nas crianças como ‘traficantes em potencial’”.

Segundo ele, os psicólogos são chamados às escolas para “moldar” essas crianças. “As demandas colocadas a nós passam por discursos como: ‘tenho um aluno que é o capeta, não fica quieto. Vai lá conversar com ele’. É preciso desconstruir essa imagem e fazer outro tipo de intervenção nesses espaços, escapando ao status quo. Temos que explicar que não estamos na escola para fazer tratamento terapêutico nem convencer o aluno de que o traficante não é o modelo de cidadão que ele deve seguir”.

Ao término das palestras, a mediadora da mesa, a psicóloga Mariana de Araújo Fiore (CRP 05/35050), fez uma avaliação positiva do debate. “Estou feliz porque conseguimos trazer as práticas de quem está na escola”. Ela abriu o debate com os presentes, que trouxeram novas questões e aprofundaram falas dos palestrantes.

Entre os temas levantados, estavam a colocação do psicólogo como “normatizador de subjetividades”; o risco de culpabilizar o professor; diferenças e semelhanças entre o trabalho na escola pública e na privada; o adoecimento do professor; a relação com os pais; a importância do trabalho não só com professores, mas também com os demais funcionários da escola; e a hierarquização que muitas vezes aparece entre os profissionais na escola.