CORONAVÍRUS NO SISTEMA CARCERÁRIO: MINISTÉRIO OBSTRUI TRABALHO DO COMITÊ NACIONAL DE PREVENÇÃO E COMBATE À TORTURA

Categoria(s):  CORONAVÍRUS, Notícias   Postado em: 27/04/2020 às 13:37

WhatsApp Image 2020-04-27 at 10.59.08Os membros da sociedade civil do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura têm demonstrado preocupação com o posicionamento da Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves, especialmente após o cancelamento  da reunião que ocorreria nesta segunda e terça-feira, 27 e 28 de abril, para tratar do aumento da contaminação pela Covid-19 dentro do sistema carcerário.

 

A falta de diálogo e a obstrução do trabalho têm se tornado preocupantes durante o momento de pandemia, mas têm sido a tônica na atual gestão. Das três reuniões do Comitê, realizadas durante o atual governo, Damares se ausentou de duas, inviabilizou os trabalhos de uma ao desrespeitar as prerrogativas da sociedade civil eleita para o Comitê – https://bit.ly/2zv6H8B, e cancelou a próxima.

 

Vale lembrar que o atual presidente da república decretou o fim da remuneração dos peritos do Mecanismo no ano passado e levou quase 10 meses para empossar os membros do Comitê que representam a sociedade civil, numa óbvia estratégia de enfraquecimento da organização.

 

 

CORONAVÍRUS NO SISTEMA CARCERÁRIO

 

A contaminação pela COVID-19 dentro do sistema carcerário brasileiro tem aumentado. Segundo a Secretaria da Saúde do Distrito Federal, 10,7% do total de brasilienses contaminados pelo novo coronavírus estão em privação de liberdade. Peritos do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura relatam situações igualmente preocupantes no restante do país, com subnotificações no Amazonas e falta de isolamento adequado no Espírito Santo. Denúncias foram recebidas acerca de casos de presos que deveriam cumprir medida no semi-aberto estarem atualmente em regime fechado, em local improvisado e de pouca higiene, no ES.

 

A polêmica medida do Diretor-Geral do DEPEN de solicitar o afastamento das Diretrizes Básicas para Arquitetura Penal (Resolução n. 9/2011-CNPCP), para que possa utilizar contêineres como um meio de criação de vagas temporárias e emergenciais nas unidades prisionais, foi recebida com muita preocupação pela sociedade civil, tendo em vista a precariedade dessas instalações (dados apontam que nestas celas a temperatura pode chegar a 50 graus, e não há ventilação nem luminosidade suficientes – https://bit.ly/2VHtIhx).

 

 

O TRABALHO DO COMITÊ

 

O Comitê é a instância responsável por avaliar e monitorar junto com o Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura, os espaços de privação de liberdade no país, como o sistema prisional, o sistema socioeducativo, hospitais psiquiátricos, comunidades terapêuticas e instituições de longa permanência para idosos, prevenindo e denunciando práticas de tortura e de tratamento cruel, desumano e degradante nesses espaços.

 

Apenas dois conselhos profissionais estão entre os membros titulares do CNPCT: o Conselho Federal de Psicologia e a Ordem dos Advogados do Brasil. Os representantes do CFP são Célia Zenaide da Silva, conselheira do Federal, e Pedro Paulo Bicalho, conselheiro-presidente do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro.

 

A principal pauta do encontro com a Ministra seria a situação das pessoas em privação de liberdade frente à pandemia. Impedir a reunião desse colegiado representa uma omissão do Ministério perante situação delicada que envolve diretamente a pasta.

 

 

OBSTRUÇÃO

 

No dia 23 de abril, o gabinete da Ministra Damares, através da sua assessoria especial, enviou e-mail à Coordenação Geral do CNPCT exigindo o cancelamento da reunião ordinária. Dentre os argumentos usados por Damares constam a falta de agenda dos representantes do governo, ignorando a existência dos suplentes nomeados para esse tipo de situação, e o questionamento sobre as competências da Mesa Diretora e da Vice Presidência do Comitê para convocar reuniões e definir pautas.

 

Os membros da sociedade civil que compõem a mesa diretora, Caio Klein, representante do SOMOS, e Vitória Buzzi, pelo Conselho Federal da OAB, propuseram redução da pauta da reunião, para que ela ao menos ocorresse, mas o governo permaneceu irredutível.

 

Buzzi explicou que em um cenário mundial de atenção redobrada à Covid-19, a Ministra indicou que não vê urgência em tratar do tema da chegada do coronavírus no sistema carcerário brasileiro. “Nós, que acompanhamos de perto a dinâmica nos espaços de privação de liberdade, sabemos que a disseminação da doença no sistema penitenciário é certa, e é a crônica de muitas mortes anunciadas, não só de presos, mas de agentes prisionais, de profissionais de saúde que atuam no sistema e das suas famílias. É alarmante que esse tema não seja urgente para um ministério que diz defender os direitos humanos”, pontuou.

 

O presidente do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro, representante do Conselho Federal de Psicologia no Comitê Pedro Paulo Bicalho afirmou, “torna-se evidente, na conjuntura atual, a necessidade de afirmar o compromisso do Brasil com o enfrentamento à tortura”.

“São tempos que conclamam a luta por ações políticas efetivas, dada a desigualdade social estruturante de nosso país. Obstruir as ações do comitê é promover, e não combater a tortura”, ressaltou, contundente, Pedro Paulo.

 

*Com informações do CNPCT.