A data marca a luta do movimento das trabalhadoras domésticas por melhores condições de vida e trabalho, e homenageia figuras como Laudelina de Campos Melo, fundadora do primeiro sindicato das trabalhadoras domésticas do Brasil.
De acordo com a Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015, o trabalho doméstico é definido como um conjunto de atividades laborais não lucrativas realizado por uma trabalhadora no local de residência de um/a empregador/a. No Brasil, tais atividades estão majoritariamente articuladas a serviços como os de limpeza, manutenção e organização das dependências, preparo de refeições, e outras formas de cuidado direcionadas aos membros das famílias empregadoras, como crianças, jovens, pessoas com deficiência, enfermos e idosos. Trata-se de um tipo de relação trabalhista bastante comum e culturalmente difundido na realidade brasileira, cujas características são resultado da herança colonial-escravista que estrutura e ainda permeia as desigualdades no mercado de trabalho brasileiro. Essa herança contribui com a constituição de um imaginário social ainda associado a mecanismos de opressão, com características servis, exercidos por meio de violências sistemáticas baseadas em hierarquias de classe, raça, gênero, entre outras.
Em sua grande maioria, o trabalho doméstico é realizado por mulheres negras provenientes de regiões periféricas ou do nordeste do país, a quem se atribui um lugar social historicamente atrelado ao exercício do cuidado com características de subserviência. Mesmo sendo uma função fundamental para a manutenção da vida cotidiana, é dotada de pouco reconhecimento e prestígio na sociedade. As trabalhadoras domésticas tem como desafio a luta, há décadas, pelo reconhecimento de seus direitos humanos e trabalhistas, em um contexto de realização de atividades, socialmente invisibilizadas, dentro do lar dos empregadores, onde são vistas como integrantes “quase da família”, ainda que não gozem de privilégios familiares.
Trabalho escravo doméstico contemporâneo
O estado do Rio de Janeiro, atualmente, é um dos que registra maior número de resgates de trabalhadoras domésticas de situação de escravização, com destaque para as situações vivenciadas por mulheres idosas, uma história que se inicia desde a exploração do trabalho infantil. O resgate é realizado pelos órgãos de repressão a esse crime: auditoria fiscal do trabalho do Ministério do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho, entre outros como a Polícia Federal.
O Rio de Janeiro é a unidade federativa com o caso de trabalhadora doméstica mais idosa (90 anos de idade) encontrada em condições análogas à escravidão, e com o caso mais longo de escravidão doméstica (72 anos de duração) já registrado na história recente.
Como características comuns destas violações, encontram-se: não pagamento de salários e benefícios, controle de documentos e valores recebidos pela trabalhadora, manipulação para o afastamento da mulher do convívio familiar e comunitário, impedimento da escolarização, longas jornadas de trabalho sem descanso e sem férias, alojamento insalubre, entre outros.
Psicólogas(os) são fundamentais tanto na prevenção, quanto no atendimento pós-resgate de pessoas que foram escravizadas, geralmente por meio de equipes multidisciplinares e em rede intersetorial, seja nas políticas públicas ou nos consultórios particulares. A trabalhadora doméstica deve contar com apoio técnico para o processo de elaboração das violências sofridas em relações laborais abusivas, onde lida com o impacto de rupturas de laços afetivos, para então construir e fortalecer vínculos familiares e comunitários.
Trabalho decente
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o conceito de trabalho decente abrange um conjunto de aspectos que caracterizam atividades laborais devidamente realizadas em condições de liberdade, equidade e dignidade. Trata-se de um marco conceitual norteador para os mecanismos de vigilância, proteção, regulação e inspeção de situações de trabalho que estejam alinhadas à garantia de direitos das classes trabalhadoras, à promoção do emprego produtivo e de qualidade, à ampliação da proteção social, e ao fortalecimento do diálogo social.
Às/Os psicólogas(os) cabe aliar-se à promoção e garantia de direitos das trabalhadoras domésticas, fortalecendo estratégias individuais e coletivas de produção da saúde e emancipação diante de condições opressivas, observando o que é singular na vida dessas mulheres e de suas famílias, para a prática “psi” fazer sentido e oferecer contribuições concretas.
A Comissão Regional de Direitos Humanos do CRP-RJ conta hoje com um Grupo de Trabalho de Combate ao Trabalho Escravo Doméstico, que produz conteúdo de orientação sobre o tema para a categoria, e recebe a colaboração de psicólogas e representantes de outras profissões, atuantes: no CRP-RJ, no Projeto Ação Integrada: Resgatando a Cidadania, no Sindicato das Trabalhadoras Domésticas, no Ministério do Desenvolvimento Social, e na Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Pessoas Privadas de Liberdade.
Sugestões de leitura:
Referências Técnicas para Atuação de Psicólogas(os) em Programas de Atenção à Mulher em Situação de Violência.
Relações Raciais. Referências Técnicas para Atuação de Psicólogas.
Trabalho Escravo Doméstico. Pontos de Atenção para Profissionais do SUAS e do SUS.
Texto: GT de Combate ao Trabalho Escravo Doméstico (CRDH)
Integrantes:
Conceição Gama (CRP 05/39882) – Psicóloga – Coordenadora da CRDH do CRP-RJ
Yasmim França (CRP 05/45973) – Psicóloga – Projeto Ação Integrada (MPT e Cáritas RJ)
Graziela Sereno (CRP 05/30279) – Psicóloga – Projeto Ação Integrada (MPT e Cáritas RJ)
Sergio Dias Guimarães Junior (CRP 05/51706) – Psicólogo – membro da Comissão de Psicologia do Trabalho do CRP-RJ
Ludmila Ribeiro Paiva – Bacharel em Direito – Projeto Ação Integrada (MPT e Cáritas RJ)
Yana Karla Santos (CRP 03/16548) – Psicóloga – Atua na Política Nacional de Atenção Integral a Saúde de Pessoas Privadas de Liberdade.
Maria Izabel Monteiro Lourenço – Trabalhadora Doméstica – Presidenta do Sindicato das Trabalhadoras Domésticas do Rio de Janeiro
Cleide Torres (CRP 03/9301) – Psicóloga
Thaiany da Silva Motta – Assistente Social – Projeto Ação Integrada (MPT e Cáritas RJ)
Francisco Xavier – Assistente Social – Ministério de Desenvolvimento Social