Saúde Mental da mulher negra é debatida na “Rodas e Encontros” em Nova Iguaçu

Categoria(s):  Notícias, RELAÇÕES RACIAIS, SUBSEDE BAIXADA   Postado em: 19/11/2019 às 10:33

baixada nov 2Promovida pela Comissão Gestora do CRP-RJ na Baixada, no dia 12 de novembro, na Subsede em Nova Iguaçu, a 39ª edição do “Rodas e Encontros” debateu a “Saúde Mental da Mulher Negra”. O evento foi oficialmente aberto pela conselheira-coordenadora da Comissão Gestora, Gabriela de Araújo Braz dos Santos (CRP 05/56462), que agradeceu a presença de todas (as) psicólogas (os), estudantes e demais pessoas presentes. Mediada pela psicóloga clínica, membro do Coletivo Conceição Chagas e voluntária na ONG Terr’ativa, Eline da Silva Vieira (CRP 05/55417), a mesa de debates contou com quatro palestrantes.

Jacqueline dos Santos Soares (CRP 05/41408), psicóloga clínica, fundadora do Espaço AmadureSer (SJM), colaboradora do CRP-RJ e membro do Coletivo Conceição Chagas, abriu a mesa prestando uma homenagem em nome do Coletivo para a figura que dá nome ao mesmo, Conceição Correia das Chagas, psicóloga e vice-presidente do CRP-RJ na época da compra da Subsede do CRP-RJ em Nova Iguaçu. “Criamos o coletivo e precisávamos colocar um nome, então resolvemos colocar o nome de uma figura especial nessa luta e que representa a Baixada”, revelou.

Os representantes do Coletivo aproveitaram a ocasião para, na presença de familiares da psicóloga, prestigiarem Conceição Chagas com um emocionado discurso e com a entrega de um buquê de flores e uma homenagem impressa oficial do CRP-RJ. “Você nos deu o exemplo vivo do quanto é importante ser solidários e realizar partilha do nosso saber, do nosso tempo, e até de nossos espaços físicos de local de trabalho e de nossas casas. Pois temos os registros do quanto você pode oferecer tudo isso, em prol dos avanços de nossas lutas por direitos e de nossa organização enquanto um coletivo!”, dizia um trecho do documento entregue à família.

Em seguida, Janaína dos Santos Ignácio Costa (CRP 05/46709), psicóloga clínica com formação em Terapia Cognitivo Comportamental, membro do Coletivo Conceição Chagas e especialista em Saúde Mental, palestrou sobre a “autoestima da mulher negra”, comentando sobre uma frase que diz: “o conceito de autoestima é a intima convicção de possuir valor enquanto pessoa”.

“Olha como isso é forte. Sabemos, como psicólogos, que a Psicologia nos mostra como se forma a autoestima, que, na verdade, é constituída através do outro, nos nossos primeiros contatos com familiares, amigos, professores e as pessoas que estão à nossa volta. É ali que esse processo vai se construindo, que vamos nos percebendo como pessoa”, afirmou.

Janaína comentou também sobre a posição da mulher negra nesse padrão “branco europeu” da nossa sociedade. “Imagina crescer sendo tudo aquilo que uma sociedade renega? Sendo uma mulher negra em uma sociedade que é, na verdade, constituída e centrada no masculino e no padrão branco de beleza, o padrão europeu. Para uma mulher negra se perceber bonita, essa luta é muito mais complexa. Percebemos, em nossa atuação nos consultórios, por exemplo, esse processo pelo qual as mulheres negras tentam se encaixar nesse padrão, sofrendo, comprometendo a sua Saúde Mental”, argumentou.

baixada nov 1Seguindo o debate, Amanda Cecília de Jesus (CRP 05/50512), psicóloga clínica graduada pela UNIABEU e uma das idealizadoras do projeto Mulheres em Crescimento, reforçou a importância do debate como ato de resistência ao racismo ainda vivo no país.

“Quando falamos da era escravista do Brasil, que foi um período de muito sofrimento, mas também de resistência, quando as pessoas escravizadas – acho interessante falar dessa forma, pois as pessoas não são escravas, elas foram escravizadas –, elas montam lugares para se refugiar e resistir, que são os quilombos. Então, ali, já começamos a perceber o quão é importante falarmos de resistência. Esse espaço que estamos construindo aqui, agora, é sim também um espaço de resistência, onde se pode falar de um assunto que ainda não é bem acolhido na sociedade”, declarou.

“O racismo no Brasil ainda é muito forte, no entanto, muito velado. É claro que, na atualidade, não consigo ver isso de forma tão velada, pois agora temos um aval de que é possível e de você pode sim dizer o que pensa independente se você vai ofender ou desrespeitar o outro”, completou a psicóloga.

Fechando a mesa, Karoline Arcanjo Apóstolo da Silva, estudante de Psicologia da UFRRJ e pesquisadora do LEVICA (Laboratório de Estudos sobre Violência Contra Criança e Adolescente), também reforçou a importância do evento nos dias de hoje e ponderou a dificuldade do ser humano de conviver com a diversidade.

“O dia de hoje é um muito simbólico e importante, principalmente se considerarmos a nova ordem moral, econômica e política do nosso pais, que não respeita a diversidade, sobretudo a diversidade racial. A diversidade humana sempre existiu e a história nos mostra a dificuldade que é lidar com o diferente: a escravidão grita isso. Porém, hoje, diferentemente dos nossos ancestrais, vivemos numa sociedade democrática, que pressupõe liberdade e igualdade de direitos”, lembrou.

Em seguida, a palestrante questionou sobre a democracia de direitos existente em nosso país. “A pergunta que me faço é: existe realmente igualdade e liberdade de direitos que tange à questão de raça e gênero? A minha resposta é: não! Porque a nossa sociedade é racista, machista, classista, opressora, patriarcal e extremamente desigual, ainda mais no aspecto de raça. Uma das áreas que denuncia que não vivemos numa democracia racial é a educação. A educação desnuda e aponta que nós, em pleno século XXI, ainda não vivemos uma democracia racial”, declarou.