CICLO DE DEBATES “(DES)MEDICALIZAÇÃO: USO, ABUSO E SEUS (D)EFEITOS COLATERAIS NAS POPULAÇÕES” TEVE ENCONTRO DE ENCERRAMENTO NO DIA 20 DE AGOSTO, EM PETRÓPOLIS

Categoria(s):  DESTAQUE DA SEMANA, MEDICALIZAÇÃO, Notícias, SAÚDE, SUBSEDE SERRANA, Últimas Notícias   Postado em: 26/08/2022 às 17:17

O Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro – CRP-RJ – , por meio do Eixo de Política sobre Álcool e Outras Drogas da Comissão Regional de Direitos Humanos, realizou o evento de encerramento do “Ciclo de Debates sobre (Des)medicalização: Uso, Abuso e seus (D)efeitos Colaterais nas Populações”, no dia 20 de agosto, na Universidade Estácio de Sá, em Petrópolis.

O evento que teve como objetivo questionar as compreensões e lógicas medicalizantes, em especial aquelas que vem sucessivamente (co)abitando os olhares e as práticas em Psicologia, finalizou o Ciclo que realizou duas outras rodas de conversa (online): “O que é isto – a medicalização?” e “Infância, educação e (des)medicalização”.

O encontro iniciou com Lucas Gonçalves pontuando sobre a estrutura pensada para estes eventos: “nós começamos o nosso trabalho no Eixo entendendo que, no meio do período pandêmico, o que poderíamos fazer era a reunião de ciclos de debates para difundir um pouco dos debates sobre o fenômeno da desmedicalização. E, agora, podemos encerrar, no formato presencial”.

4BD388CD-76EC-41BA-BD8D-15FFF717E1B9Abordando os desafios do cuidado em saúde mental, a partir de uma perspectiva não medicalizantes, Victoria Gutiérrez, conselheira do XVI Plenário do CRP-RJ e coordenadora do Eixo Álcool e Outras Drogas, explicou, “começamos a perceber que as pessoas falam muito das drogas ilícitas, mas não das drogas lícitas: a medicalização. Em 2020, com a declaração da pandemia, nós vimos o aumento do uso dos ansiolíticos e antidepressivos. Às vezes vemos diagnósticos desenfreados de TDAH e várias outras coisas na tentativa de medicalizar o sentimento, então achamos mais do que necessário começar a discutir sobre desmedicalização”.

Em seguida, Rossano Cabral, psiquiatra, pontuou sobre a lógica medicalizante em relação à infância: “no caso das crianças, temos distintos graus de adesão dos pais a demanda à medicalização dos problemas dos filhos, principalmente quando o diagnóstico psiquiátrico aparece como a primeira explicação e o remédio aparece como o primeiro recurso terapêutico que vai tentar erradicar aquilo que eu não suporto no meu filho ou que a escola não suporta em seus alunos”.

É possível perceber que o fenômeno da medicalização, que não é novo, mas que vem se acentuando drasticamente nos últimos anos, tem-se alicerçado sobre uma concepção de vida somente baseada nos aspectos biológicos, percebendo o processo saúde-sofrimento, vivências-diferenças, em uma perspectiva reducionista e superficial. Conforme Alexandre Vasilenskas, conselheiro do XVI Plenário do CRP-RJ e coordenador do Núcleo de Saúde Mental, explicou: “muitas vezes o nosso paciente se sente aliviado de ouvir que, sim, ele pode estar se sentindo mal com o que está vivendo. Estamos ‘saindo’ de uma pandemia, passamos por diversas situações trágicas e emergenciais, precisamos elaborar o luto. E isso é mais do que aceitável, isso é o esperado. Precisamos ter o direito de sentir sem que isso seja enquadrado num diagnóstico, e numa lógica que só pensa em medicalizar as diferenças humanas”.

Após uma pausa para o almoço, no início da tarde, foi composta a segunda e última mesa do evento, com a participação da psicóloga e pós-doutora em Educação Cláudia da Costa Guimarães, e do psiquiatra, pioneiro na Luta Antimanicomial no Brasil e presidente de honra da Abrasme Paulo Amarante. A mediação foi da psicóloga e colaboradora do Eixo Álcool e Outras Drogas do CRP-RJ, Camila Motta Gomes.

65C15A75-FFAD-40B6-86F1-78E0B58B7249Claudia Gomes abriu a mesa falando que “a principal questão enquanto psicólogas (os) não é negar a relação entre o individual e o social. O indivíduo realmente tem cada vez mais sofrido as questões que a nossa sociedade nos apresenta. Então, o sofrimento é vivido pelo indivíduo a partir das pressões do mundo, então quando pensamos em desmedicalização não podemos relativizar a relação entre individual e social”.

Com isso, pode-se inferir que as subjetividades produzidas nos sujeitos a partir de questões sociais, tais como raça, gênero, sexualidade, religião, território, econômicas, entre tantas outras, não devem ser separadas quando se trata de uma questão individual. Os atravessamentos que afetam os sujeitos favorecem ou, até mesmo, provocam sentimentos e questionamentos que são colocados num atendimento psicológico. E a partir disso, é imprescindível que a (o) profissional entenda tais demandas para além do paradigma medicalizante.

D26B4647-5BE3-4CCE-A701-1D92C00C963FSegundo Paulo Amarante, “o problema do medicamento é que ele era uma coisa, há 30 anos atrás. Já havia uso excessivo de medicamento, medicamento mal indicado, etc. Mas, depois de algum tempo, (e isso ficou muito nítido para mim, no livro ‘’A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos’’ de Marcia Angell) a indústria farmacêutica deixa de produzir medicamentos com a finalidade da saúde para começar a por em prática uma política de mercado. Nesse novo perfil, ela (indústria farmacêutica)começa a inventar doenças, aumentar o uso das enfermidades, a diminuir conscientemente as informações sobre efeitos colaterais nas bulas”.

3196A471-C203-4A3C-9216-C9233E5D7738Ao fim das falas dos palestrantes, foi aberto espaço para perguntas e colocações do público presente, o que agregou ao debate, fomentando um espaço de reflexão sobre as práticas medicalizantes que muitas vezes servem à lógica neoliberal econômica, passando ao largo da busca pela saúde ou bem-estar das pessoas, aprisionando ou entorpecendo os sentimentos e as diferenças no exisitirhumano.

O debate foi transmitido ao vivo e está disponível nos links a seguir https://www.youtube.com/watch?v=wl5WcHIE4g4 e https://www.youtube.com/watch?v=hqmjmPlLzq4